Por Geraldo Lima
Dança (ou Almodóvar)
Ambos movendo-se no círculo de fogo, devorados pelo desejo. Dois estranhos, quase. Ravel inundando a sala, os corpos. Um minuto antes, pensara em fugir; mas, agora, presa ao ímã do olhar, deixava-se arrastar até o olho do furacão. Parecia tão manso, outra espécie de homem; súbito, porém, crispou os lábios, e a mão cortou o ar, dilacerando o encanto.
Memória
Pensou nas duas crianças presas em casa, na cadelinha unhando a porta para entrar (odeia ficar no quintal à noite), no gás vazando, asfixiando o ambiente, e no tempo que levaria para conseguir esquecer tudo isso.
Oh, não!
Agora só estamos nós dois aqui, o homem disse com voz de lâmina cortante. A porta fechou-se com estrondo, e o tempo parou de pulsar.
Esses são os três últimos microcontos do livro Breu, que se tornou parte do livro Tesselário, cuja publicação deve ocorrer ainda este ano pela Editora Multifoco. Na sequência, postarei microcontos da primeira parte do Tesselário, denominada Tesselas.
8 comentários:
Dança sensual (e dolorosa, creio). Geraldo, você tem o poder da síntese em tessitura poética.
Que venha o Tesselário!
Geraldo, frugal e pleno. Em especial o "Oh, não!" me lembrou o barulho de uma faca ao bater com o metal.
Homero, muito obrigado pelo seu comentário. E vamos ao Tesselário.
Um abração
Valeu, André. obrigado por suas palavras.
Dança. Conto enigmático como o "círculo de fogo". É isso aí, caro Geraldo. A boa literatura não revela, mas instiga. E a linguagem, impecável. Só os grandes literatos conseguem fazer literatura em poucas linhas. (Joel)
Obrigado, Joel, pelas suas palavras. Creio que o papel fundamental da literatura é instigar, levar à reflexão, nos tirar da cômoda posição de observar de longe.
Parabéns, Geraldo, por nos presentear com essa tessitura instigante.Retado que só!
Hélverton, bom vê-lo por aqui. Gostei do "tessitura instigante". A partir de agora fará parte da definição da minha narrativa. Obrigado, meu caro!
Postar um comentário